Artes
A Arte, seja ela qual for, deve interpelar-nos mas não nos deve chocar. Já o mesmo não se poderá dizer da vulgaridade.
É preciso dar um sentido à vida e a filosofia não deixa de ser isso mesmo: uma busca de sentido e, também, uma espécie de lubrificante no movimento da mecânica social.
Espreitar maniacamente os outros sempre foi uma tentação dos moralistas mais tacanhos, para os quais qualquer alusão à sexualidade é “pornografia” (...). Aos que gostam de subtrair aos outros o prazer que a si incomoda, apetece dizer que não metam o nariz na vida alheia, que deixem em paz os que não pensam como eles, e que a grande virtude não consiste em suprimir as tentações, mas em saber resistir-lhes...
Assim como o computador, a internet e as redes sociais protagonizam uma verdadeira revolução digital e introduzem alterações profundas na sociedade actual, também o cartaz sofre alterações profundas, desdobrando-se a partir de então em formatos distintos.
Triste é verificar que o chamado mundo livre está a ser atravessado por uma perigosa deriva moralista e puritana, que a censura não anda apenas de braço dado com as ditaduras, mas também marca presença nos chás dançantes e artísticos das democracias.
A mola do remorso que impele Adrien a encontrar Anna, a noiva alemã de Frantz, e a visitar a campa onde este foi sepultado, revela-nos também uma verdadeira arqueologia do desconforto e do sofrimento psíquico.
Este poema de Jorge de Sena mostra a rara beleza do diálogo íntimo que ele estabelece com o quadro de Fragonard.
Sublime história de amor entre duas mulheres, o filme é também um murro no estômago dos preconceitos. Filme avassalador, onde o amor está para lá do género e se passeia de braço dado com referências artísticas, filosóficas e até gastronómicas.
Cultura e Autores Aveirenses
O apagamento da memória de um vulto desta grandeza na vida cultural aveirense não representa, apenas, um esquecimento aviltante. É também, para aqueles que o conheceram, uma faca de saudade atravessada na garganta.
Mais do que um homem de partido, Candal gostava de tomar partido. Esteve praticamente sempre do lado contrário ao dos seus correlegionários que assumiam o poder.
Após ler Os Sítios Nossos Conhecidos e Daqui Ouve-se o Mar, concluí estarmos em presença de um grande escritor da Gândara. Parafraseando Carlos de Oliveira em Pequenos Burgueses, apetece dizer, sem favor, que a obra de Idalécio Cação é “uma chuva de luz a encharcar a Gândara do céu à terra”.
Nenhuma idade é boa para morrer. Ninguém devia morrer quando tem um livro para ler. Num tempo em que se arrasta por aí tanto exibicionismo sem qualidade, tinha que dar a conhecer, embora com frágeis palavras, a qualidade humana e poética do João Tomaz Parreira.
Qualquer destes suplementos, com preocupações mais formativas que noticiosas, se insere na categoria de imprensa cultural, literária e artística, atentas as áreas de interesse que encontramos na sua consulta.
Este conto tem a particularidade de se desenrolar no extinto concelho do Couto da Vila de Sorães (actual freguesia de Santa Catarina, do concelho de Vagos) que nas Memórias Paroquiais de 1758 incluía o lugar de Bustos, parte do Sobreiro e o lugar da Barreira.
Cultura e Autores Bairradinos
Enquanto no tempo dos Judeus se comia, pelo Natal, a carne do Cordeiro Pascal, com pão ázimo e legumes, no nosso tempo a imolação do cordeiro assado no forno foi substituída pelo bacalhau pescado nas costas da Noruega ou nos Bancos da Terra Nova.
É uma triste ironia ver um símbolo do municipalismo morrer nas barbas dos oliveirenses e no regaço da indiferença do próprio poder municipal.
As identidades só fazem sentido quando abertas ao diálogo entre tradição (transmissão, dádiva, herança que recebemos das gerações que nos precederam) e modernidade (o que se acrescenta à herança recebida, o que criamos de novo, inovando e acrescentando).
É sobretudo em alguns livros de ficção, nomeadamente os que albergam contos com indiscutível sabor ao chão, às gentes e ao ambiente da Bairrada – leia-se O Vendedor de Tapetes, ou As Vinhas da Memória – que Armor Pires Mota mais se parece cumprir como escritor.
Num tempo de esbatimento acelerado das identidades, de choque cada vez mais agudo entre o velho e o novo, entre o passado e o futuro, entre tradição e inovação, ninguém como Arsénio Mota lançou sobre a Bairrada o olhar regional com que sempre a quis ver.
Num momento em que a Bairrada parece deixar-se embrulhar, novamente, em espesso manto de silêncio cultural, é proibido esquecer o que Arsénio Mota fez por ela, e também pela terra onde nasceu, à qual dedicou três monografias. Ambas lhe devem muito. Resta saber se uma e outra têm feito o que devem para merecer Arsénio Mota.
A consulta deste Dicionário ajuda a confirmar o que já há muito se pressentia: que a Bairrada tem “presença” efectiva não apenas na literatura, mas também na cultura em sentido mais amplo.
Aqui fica o reconhecimento a um homem que tem feito da escrita uma espécie de última trincheira da liberdade. Não queremos que este encontro seja uma espécie de epitáfio da sua actividade literária. Sabemos que vai continuar a brindar-nos com a prosa sumarenta a que sempre nos habituou.
Cértima não combateu pela República durante a Primeira Grande Guerra. O que verdadeiramente o animava era Portugal e a manutenção da integridade das colónias. Sobrepunha a ideia de Pátria à questão do regime: "Pela ideia de Pátria (...) fui eu até aos inóspitos sertões de Moçambique".
Como Miguel França Martins nunca publicou qualquer livro, quase ninguém conhece os saborosos textos que derramou na imprensa, sem esquecer os dedicados ao teatro popular e versos para cortejos populares, igualmente inéditos.
Enquanto forma de expressão intemporal, o artesanato define a alma de um povo. Assim sendo, o carácter rural da Bairrada confere uma marca distintiva a algum do seu artesanato. E molda-lhe também uma alma muito própria.
Letras sob Protesto é a denúncia da simplificação acelerada da literatura e das leituras massificadas. Ergue-se contra a homogeneização dos gostos, a submissão do acto criativo a cálculos de rentabilidade imediata.
António Capão é um archote da cultura bairradina que não podemos deixar extinguir. Não deixemos que uma hera de silêncio comece a enroscar-se dolorosamente em torno do seu nome.
Sem a implantação da República, dificilmente Bustos se teria separado da Mamarrosa em 1920. As óbvias afinidades ideológicas entre os republicanos democráticos de ambas as localidades parecem ter desempenhado um papel decisivo em todo este processo.
Embora a paródia seja uma constante na descrição de alguns eventos políticos concelhios, a política não é depreciada. É tratada com seriedade, porque a política tem de ser moral para ser eficaz.
Os forais são documentos valiosíssimos enquanto repositórios de memórias que podem e devem ser transmitidas às gerações actuais e futuras.
Ao recusar a subversão dos valores sagrados do jornalismo, que as novas tecnologias vieram acentuar, há no jornalista-escritor Arsénio Mota uma espécie de desencanto idêntico ao que um dia acometeu Antero.
Há em Paulo Sarmento muito de dispersão, fragmentação e errância. Cabe, pois, ao leitor a tentativa (que se espera lúdica) de reunir tantas limalhas dispersas. Sem se preocupar com o sentido que o autor possa atribuir ao que escreve.
Em nenhum outro livro Arsénio Mota nos desvenda os estados de alma e nos franqueia as portas para mostrar os veludos da interioridade.
Num tempo em que as ordens religiosas foram expulsas, muitos padres perseguidos e alguns bispos exilados, e em que os bens da Igreja foram confiscados, o exercício do múnus eclesiástico por um jovem padre como era então Acúrcio Correia da Silva, que foi também autor da letra do Hino da Bairrada, estava longe de ser fácil.
Estudos Regionais
As identidades só fazem sentido quando abertas ao diálogo entre tradição (transmissão, dádiva, herança que recebemos das gerações que nos precederam) e modernidade (o que se acrescenta à herança recebida, o que criamos de novo, inovando e acrescentando).
Gastronomia
Pode a gastronomia tradicional estar condenada a fazer parte de um passado morto, que paulatinamente se dilui nas brumas da memória, mas sem passado que nos ilumine o presente é uma sombra do que fomos e o futuro uma incerteza larvar de besouros, grilos, escorpiões e gafanhotos.
Guerra Colonial
Quase todos os soldados voltavam com recordações, uma máscara, um boneco de pau, uma orelha numa garrafa de álcool, um garoto, um braço a menos.
Aos jovens com 20 anos deparava-se o dilema de ir para a guerra. As alternativas de lhe fugir eram a emigração clandestina ou então optar pela pesca do bacalhau nos mares longínquos e gelados da Gronelândia e Terra Nova.
História
Em tempos de eriçado anticlericalismo o toque dos sinos era considerado, por muitos, como a mais ruidosa das manifestações do culto externo.
Obrigado pela Identificação de Um País, pela Nobreza Medieval Portuguesa, pel’A Escrita da História e também por Levantar o Céu, já que o labor científico nunca dispensou a atenção ao transcendente e ao sagrado.
O que interessa reter é se valorizamos mais a obediência cega às leis ou o sentido profundamente humano da desobediência do cônsul em Bordéus, ao recusar ser cúmplice dos crimes de guerra nazis.
Cértima não combateu pela República durante a Primeira Grande Guerra. O que verdadeiramente o animava era Portugal e a manutenção da integridade das colónias. Sobrepunha a ideia de Pátria à questão do regime: "Pela ideia de Pátria (...) fui eu até aos inóspitos sertões de Moçambique".
Era assim António Hespanha. Recordo agora com saudade as aulas, mas sobretudo o lugar onde, no final, elas costumavam desaguar: os corredores do Instituto de Ciências Sociais. Era neles que o Professor gostava de confraternizar com os seus alunos.
Sem a implantação da República, dificilmente Bustos se teria separado da Mamarrosa em 1920. As óbvias afinidades ideológicas entre os republicanos democráticos de ambas as localidades parecem ter desempenhado um papel decisivo em todo este processo.
Os forais são documentos valiosíssimos enquanto repositórios de memórias que podem e devem ser transmitidas às gerações actuais e futuras.
Quando Marcelo Caetano tomou posse como Presidente do Conselho em 1968, houve quem embarcasse na ilusão de que poderia democratizar o país. O problema é que nunca acreditou que a democracia pudesse vingar em Portugal.
Aos jovens com 20 anos deparava-se o dilema de ir para a guerra. As alternativas de lhe fugir eram a emigração clandestina ou então optar pela pesca do bacalhau nos mares longínquos e gelados da Gronelândia e Terra Nova.
Imprensa e Televisão
Ao deixar-nos agora, José Tengarrinha legou-nos também importantes obras para a compreensão da história da imprensa periódica, do Portugal oitocentista e da história contemporânea de Portugal.
Sai Ana Cristina Leonardo. Fica o Tolentino (cardeal), mas como já se foi o Nicolau, impossível termos o Nicolau Tolentino (o da poesia e das sátiras). E continua Pedro Mexia, que é muito mais que o pretérito imperfeito do verbo mexer.
Querem-nos medíocres e desprovidos de imaginação, para assim criarem uma vasta área de mercado onde possam babar-se (sem receio de virem a ser penalizados) da sua própria mediocridade.
Internacional
A política não pode estar refém do ódio. O destino destes irmãos desavindos não se constrói a regar com gasolina as labaredas da intolerância que continuam a consumi-los. O que Amos Oz nos ensina é que qualquer paz conquistada pela submissão à violência é ainda uma violência.
Escrevo estas linhas com preocupação, porque amo o Brasil e o colorido das palavras forjadas na olaria tropical. Também porque penso que, ganhe quem ganhar, o Brasil não vai ficar bonito: na próxima segunda-feira vamos ter um país mais radicalizado e mais violento.
Impossível não estabelecer comparações entre Stephen Hawking e Frida Kahlo. Ambos parecem guindar-se, uma vez desaparecidos fisicamente, ao estatuto de mito que suplanta as próprias obras.
A criminalização de quem ajuda a salvar vidas é um escarro lançado à nossa consciência. Não é só Veneza que se afunda. É também a Europa que cai a pique, ao perder cada vez mais as referências da sua ancestral tradição humanista.
Literatura
A academia sueca, fragilizada com algumas demissões, pretende agora envolver mais pessoas no processo de escolha do Nobel da Literatura. Ora parece-me que o que esta gente está mesmo a precisar é de ser dinamitada (prestemos justiça ao seu fundador).
Parece que Agustina tinha por hábito beber uma taça de champanhe ao almoço e outra ao jantar. Quem assim tanto gostava de celebrar a vida, merece que brindemos por ela.
Eis como ler pode ser uma outra forma de subir na vida, num tempo em que o capitalismo transforma a cultura em comércio e só parece ter valor aquilo que é convertível em dinheiro.
Acho este trecho de diálogo ficcionado, entre Fernando Pessoa e sua mãe, uma delícia. Pertence ao excelente romance de António Breda Carvalho, Morrer Na Outra Margem.
Deixem as ossadas do Eça em paz. Estão bem onde estão, longe da pompa citadina e da vacuidade que a sua ironia sempre fustigou. Mais perto do frango alourado com arroz de favas, prato incontornável da gastronomia do Marão.
Galardoado, entre outros, com os Prémios Camões e Pessoa, Eduardo Lourenço não morria de amores por um certo anel de ferro do unanimismo que se foi apertando em torno do seu nome.
Traçar uma fronteira é definir, e definir é sempre limitar. O último número da revista Granta apresenta como tema de capa as fronteiras e quer dar a volta a essa limitação.
Jorge de Sena lutou contra a morosidade e o descaso dos editores portugueses. Contra a falta de atenção à sua obra, que muito o feria por acreditar na força daquilo que publicava.
O traço de união para tamanha empatia, capaz de criar laços entre duas personalidades tão distantes e tão distintas como eram Luiz Pacheco e Laureano Barros,, só pode ser este: o amor e a paixão que ambos nutrem pelos livros e pela literatura.
Letras sob Protesto é a denúncia da simplificação acelerada da literatura e das leituras massificadas. Ergue-se contra a homogeneização dos gostos, a submissão do acto criativo a cálculos de rentabilidade imediata.
Algumas obras de Maria Velho da Costa não são de leitura fácil e por isso reclamam, pelo menos, uma segunda leitura, para que possamos atingir a subtileza das camadas mais profundas da sua escrita.
Após ler Os Sítios Nossos Conhecidos e Daqui Ouve-se o Mar, concluí estarmos em presença de um grande escritor da Gândara. Parafraseando Carlos de Oliveira em Pequenos Burgueses, apetece dizer, sem favor, que a obra de Idalécio Cação é “uma chuva de luz a encharcar a Gândara do céu à terra”.
Dizia Beckett que o dia da morte é como qualquer outro, só que mais curto. Hoje foi o dia mais curto das vidas de Rubem Fonseca e Luis Sepúlveda.
A cultura sofre mais um rude golpe com o desaparecimento desta editora. A visão de uma utopia generosa foi apagada pelas cataratas da indiferença de quem poderia ter feito alguma coisa para a salvar.
Não é só na prosa portuguesa sobre o Natal que deparamos com amargura ou desalento. Na poesia esses elementos também estão presentes, ou não fossem os poetas sensíveis aos azares de tantas existências viúvas de alegrias.
Ruben A. nunca foi um autor canónico, alguém que se deixasse manietar por qualquer corrente literária ou por qualquer estrutura formal de pensamento.
Qualquer destes suplementos, com preocupações mais formativas que noticiosas, se insere na categoria de imprensa cultural, literária e artística, atentas as áreas de interesse que encontramos na sua consulta.
Ao recusar a subversão dos valores sagrados do jornalismo, que as novas tecnologias vieram acentuar, há no jornalista-escritor Arsénio Mota uma espécie de desencanto idêntico ao que um dia acometeu Antero.
Há em Paulo Sarmento muito de dispersão, fragmentação e errância. Cabe, pois, ao leitor a tentativa (que se espera lúdica) de reunir tantas limalhas dispersas. Sem se preocupar com o sentido que o autor possa atribuir ao que escreve.
A Peregrinação é, a par de Os Lusíadas e da História Trágico-Marítima, uma das três obras literárias fundamentais para a compreensão dos traços dominantes da expansão portuguesa no mundo.
Que coisa macabra! Que murro no estômago, logo nos primeiros dias do ano – dirão alguns amigos leitores. Talvez tenham razão. Mas é bom recordar o discutido e controverso comentário de André Gide: “É com bons sentimentos que se faz má literatura”.
Em nenhum outro livro Arsénio Mota nos desvenda os estados de alma e nos franqueia as portas para mostrar os veludos da interioridade.
Rimbaud a correr para Paris, ao encontro de Verlaine. A viajar pelos "caminhos do céu" (os da poesia e, quem sabe, os do inferno). Verlaine perdido na aventura dos excessos. Dois talentos em estado puro.
A falta que nos faz o Eduardo. Um sismógrafo do quotidiano. Uma presença constante, e cúmplice, com o “ar do tempo”.
Nos lugares por onde passou captou ritmos e imagens, exprimiu emoções, engendrou metáforas. Amantíssimo dos clássicos, cultivava no poema a divina proporção, num virtuosismo sem falhas.
Palhaça
Em tempos de eriçado anticlericalismo o toque dos sinos era considerado, por muitos, como a mais ruidosa das manifestações do culto externo.
O que é histórico é que, em data que desconhecemos, se construiu a capelinha de S. Pedro, no local onde hoje se encontra a actual igreja, sendo esta um produto de sucessivas transformações daquela.
Na Palhaça, a primeira vez que se realizou o auto dos Reis Magos foi no dia 6 de Janeiro de 1925, num tempo em que a I República se encontrava já agonizante e em vésperas de ser derrubada.
Esta gente merece ser lembrada como qualquer outra. Respeitosamente, como o tem sido até agora. Para o bem e para o mal, foi gente da nossa gente. Pobre, às vezes muito pobre, mas séria e digna.
Eras então aldeia pequena, perdida nas brumas do passado. Como eu, largaste os calções, engravataste-te, cresceste de forma um tanto desajeitada, às vezes pões moderno onde devia ser antigo e antigo onde devia ser moderno. Dores de crescimento, presumo.
Renega a construção em altura, ao menos no teu largo primitivo. Não coqueteies com arquitectos ou engenheiros a perda do teu carácter: nada pode substituir a beleza de um céu de anil encaixilhado no teu coreto singelo, encimado pela sentinela cívica que é o nosso padroeiro.
Para merecer os favores do Pai Natal, Tiago recriava o presépio com todos os elementos, manjedoura e tudo, tal como aprendera na catequese.
Este texto documenta a presença do Dr. Egas Moniz, futuro Prémio Nobel da Medicina, num comício na Palhaça, dois anos antes da impantação da República em Portugal.
Não é fácil assistir ao quebrar dos últimos elos de ligação às origens. Nem assistir, mesmo em nome do progresso, à falta de respeito pelo passado que nos identifica, e ao qual devemos ser fiéis.
As mulheres na política melhoram a qualidade da democracia e conferem-lhe uma nova dimensão: uma representatividade nos órgãos eleitos mais conforme à composição da sociedade.
Ter um CAO é um privilégio para qualquer freguesia. Ele dá, a quem mais precisa, oportunidades de participação e gera interacções positivas entre pessoas que o frequentam e o meio que as envolve.
Em 1937, com o auxílio da Câmara Municipal, procede a Junta à electrificação da freguesia, construindo por sua conta a cabine e fornecendo todos os postes, posteletes e consolas e a mão de obra de todo o pessoal auxiliar para a mesma electrificação.
António Capão é um archote da cultura bairradina que não podemos deixar extinguir. Não deixemos que uma hera de silêncio comece a enroscar-se dolorosamente em torno do seu nome.
De nada vale elogiar o papel das freguesias e enaltecer as suas virtudes em prol do bem comum e ao mesmo tempo propor-lhes casamentos de conveniência de utilidade mais que duvidosa.
Relembre-se que o chamado “pacote autárquico” não se restringe apenas à controversa agregação de freguesias. Inclui também a legislação eleitoral autárquica e a da própria gestão municipal.
A melhor reforma autárquica possível será aquela que assenta em motivos sociais e humanos e não exclusivamente em argumentos ou estandartes políticos, o que implica ouvir as populações e não apenas os aparelhos partidários.
A minha dificuldade em aderir a esta reorganização do território assenta no facto de não acreditar que ela possa ter êxito sem uma verdadeira reforma dos municípios.
Bem sei que a vida é uma passagem e que ignoramos o que nos espera do lado de lá, ao qual tu já pertences. Mas a notícia de uma morte inesperada é sempre um grande desconforto.
Património
É uma triste ironia ver um símbolo do municipalismo morrer nas barbas dos oliveirenses e no regaço da indiferença do próprio poder municipal.
Enquanto forma de expressão intemporal, o artesanato define a alma de um povo. Assim sendo, o carácter rural da Bairrada confere uma marca distintiva a algum do seu artesanato. E molda-lhe também uma alma muito própria.
Contra os que dobram a cerviz à curvatura de interesses que nada têm a ver com a cultura e a transformam em mercadoria, é preciso um “golpe de asa” que salve a Poetria da extinção.
Poesia
A responsabilidade do poeta consiste em escrever versos capazes de sobreviver às circunstâncias históricas do seu tempo. Precisamos de nos libertar da crosta dos preconceitos para reconhecer mérito a um poeta que muitos preferem manter arquivado.
Essa ideia de Adorno, segundo a qual não é possível escrever poesia depois de Auschwitz, tem muito que se lhe diga. É como acreditar, por absurdo, que podemos proibir os pássaros de cantar.
A poesia, mesmo quando sai da pena retorcida de um poetastro que ninguém conhece, pode muito bem ser aquilo que Lawrence Ferlinghetti dizia dela: uma arte insurgente.
Jesus, o doce Jesus,/
o mesmo que nasceu na manjedoura,/
veio pôr no sapinho/
do Pedrinho/
uma metralhadora.
Nesse dia, tinha vinte e um anos. / Não podia ficar em casa, / amor, / aquartelado em cobardias. /De arma na mão / fui afinar o coração / ao compasso das mais belas melodias.
Avesso ao ruído e ao tumulto do mundo, Eugénio de Andrade justificava as raras aparições públicas com “essa debilidade do coração que é a amizade”. Um cultor – digamos assim – do espaço purificado do silêncio.
O apagamento da memória de um vulto desta grandeza na vida cultural aveirense não representa, apenas, um esquecimento aviltante. É também, para aqueles que o conheceram, uma faca de saudade atravessada na garganta.
Emudeceu a lira insubmissa e desalinhada, no derradeiro solo. Homem discreto e reservado, apenas se expandia nos versos. O poeta raro e bissexto finou-se hoje, pela manhã.
Cesariny foi o poeta da insurreição permanente contra as convenções morais ou estéticas do seu tempo. Em momentos de privação da liberdade ergueu a voz em haste de coragem contra os servilismos rastejantes. Era essa a sua forma de exorcizar o medo, de transgredir e afrontar o sistema.
Não é só na prosa portuguesa sobre o Natal que deparamos com amargura ou desalento. Na poesia esses elementos também estão presentes, ou não fossem os poetas sensíveis aos azares de tantas existências viúvas de alegrias.
Natália Correia era o elogio da noite, da boémia e dos amores. Misto de sibila e feiticeira, livre e insubmissa, prestou relevantes serviços à causa da cultura e da liberdade em Portugal.
Este poema de Jorge de Sena mostra a rara beleza do diálogo íntimo que ele estabelece com o quadro de Fragonard.
Não me esqueci de nada, mãe./
Guardo a tua voz dentro de mim./
E deixo as rosas.
O sucesso inicial foi tão retumbante que até Miguel Esteves Cardoso considerou O Meu Pipi genial. Entretanto, tinha-se gerado uma febre especulativa em torno do autor do blogue. Alguém, seguramente, com uma cultura e um humor muito acima da média.
falo-te companheiro/
deste mês Abril/
e da tua força/
em que não há enganos
Contra os que dobram a cerviz à curvatura de interesses que nada têm a ver com a cultura e a transformam em mercadoria, é preciso um “golpe de asa” que salve a Poetria da extinção.
Considero Rui Knopfli um dos melhores poetas contemporâneos de língua portuguesa. Sem uma terra a que pudesse chamar sua, sentia-se estrangeirado n’O País dos Outros, título do primeiro livro (1959).
Política à Portuguesa
De repente, acordo. E porque há sonhos que podem tornar-se realidade, decido: vou mesmo usar o vestido como disfarce.
Estas obras, penduradas nos gabinetes dos ministérios, ajudavam a aliviar o cinzentismo de quem pratica funções cinzentas. Quem lhes deu sumiço, optou por aliviar as paredes e não o cinzentismo.
As listas sem patrocínio partidário não agradam, é bom de ver, aos que tudo têm feito para enquadrar e até monopolizar os direitos dos cidadãos.
Esta criminosa condescendência do poder político e judicial para com os abusos e as ilegalidades dos todo-poderosos espelha bem a miséria portuguesa, mais mental do que outra coisa qualquer.
O então ministro da Economia bateu no fundo da minha consideração quando resolveu brindar com um “par de cornos” um deputado da oposição. Gesto técnico lamentável, porque desprovido de qualquer sentido ético ou estético, e ainda menos sentido de Estado.
Como refere Eduardo Lourenço, “a opacidade reverteu para o interior de cada partido de massa e é tanto mais densa quanto mais de massa for”.
Sempre que em política se despreza o debate de ideias, o que sobressai é a atávica impreparação dos contendores. Ceder à tentação do rótulo excessivo nunca foi a melhor via para ganhar o crédito dos eleitores.
Uma rã pode desempenhar múltiplas tarefas. Se, por exemplo, faz cópias, podemos chamar-lhe... a rã que xerox! (Mia Couto, “Cronicando”, p. 130). Se, mesmo lelé da cuca, consegue escrever as suas memórias, podemos encontrar aí coisas engraçadas.
O que separava irremediavelmente Alexandre Herculano de Lopes de Mendonça é muito mais que o caminho de ferro. São duas concepções antagónicas de Estado e da liberdade, que reflectem a tensão, nunca inteiramente resolvida ou superada, entre democracia e liberalismo.
Sempre que um político do governo corrompe ou se deixa corromper, está, embora metaforicamente, a colocar os cornos a todos os portugueses.
Como não soube voar baixinho, a presidente da Raríssimas acabou por se tornar vítima da conhecida ambição de Ícaro: tanto se aproximou do sol, que acabou por derreter as asas e estatelar-se ao comprido.
Mário Sacramento não confundia o confronto civilizado com um palco onde se desenrolam duelos de caneta. Frátria é um hino à compreensão das diferenças, onde é possível perceber que a fé transcende as ideologias e o debate entre marxistas e católicos permite equacionar as relações entre a existência e a transcendência.
De nada vale elogiar o papel das freguesias e enaltecer as suas virtudes em prol do bem comum e ao mesmo tempo propor-lhes casamentos de conveniência de utilidade mais que duvidosa.
Relembre-se que o chamado “pacote autárquico” não se restringe apenas à controversa agregação de freguesias. Inclui também a legislação eleitoral autárquica e a da própria gestão municipal.
A melhor reforma autárquica possível será aquela que assenta em motivos sociais e humanos e não exclusivamente em argumentos ou estandartes políticos, o que implica ouvir as populações e não apenas os aparelhos partidários.
A minha dificuldade em aderir a esta reorganização do território assenta no facto de não acreditar que ela possa ter êxito sem uma verdadeira reforma dos municípios.
Salgueiro Maia viria a falecer em 3 de Abril de 1992. Choraram-no os que nunca o mereceram. Os que sempre lhe recusaram promoções. Os que têm sempre à mão o lenço nacional para enxugar as lagrimetas de ocasião.
O que o Outro pensa não pode ser visto com hostilidade ou ameaça. A solução não passa por erguer muros em vez de pontes. A cultura da hospitalidade deve prevalecer sobre a cultura da indiferença ou da guerrilha permanente.
No actual estado comatoso em que se encontram, as sondagens parecem representar mais um perigo do que um benefício para a qualidade da nossa democracia.
Redes Sociais
Pensar e reflectir são coisas que requerem um processo mental lento. As coisas passam ao nosso lado sem as experienciarmos, sem as habitarmos. É tempo, pois, de iniciar o combate ao "demónio" da velocidade.
Religião
As mais conhecidas anedotas versavam a licenciosidade dos padres, que supostamente andariam metidos com uma mulher casada, cujo marido não estava habitualmente em casa.
Digamos que o filme Dois Papas lança mão do conhecido recurso psicológico da empatia, com inclinação evidente para o Papa Francisco. Pena não ter sido capaz de nos fazer simpatizar com um Papa sem apoucar a imagem daquele que o precedeu.
O livro do jornalista e sociólogo francês Frédéric Martel promete ser uma verdadeira pedrada no charco, capaz de agitar os gansos do Capitólio, ao mostrar que na Santa Sé reside uma das maiores comunidades homossexuais do mundo.
Bons eram os Natais em que não havia lugares vazios na mesa e os rigores de inverno se aplacavam à conversa, com os corpos amornados à sonolência da lareira.
Assim trata padre Melícias os que desafiam o seu poder. Ora manda os inspectores plantar couves, ora aponta o dedo acusador a ministros e secretariozecos, como quem se movimenta nos quadros mentais de uma república de súbditos e não de cidadãos.
Esta forma de prolongar a agonia dos descrentes traz-nos invariavelmente à lembrança a condenação de Prometeu, acorrentado a um rochedo do Cáucaso: uma águia ia todos os dias devorar-lhe o fígado, que continuamente se refazia, para que o suplício fosse interminável.
Sem categoria
Mário Sacramento não confundia o confronto civilizado com um palco onde se desenrolam duelos de caneta. Frátria é um hino à compreensão das diferenças, onde é possível perceber que a fé transcende as ideologias e o debate entre marxistas e católicos permite equacionar as relações entre a existência e a transcendência.
Sociedade
Os aveirenses que se cuidem. Os que mandaram gravar no obelisco do cemitério, ao lado dos mortos, o nome de ex-Presidentes de Câmara ainda vivos, são bem capazes de mandar rezar-lhes uma missa de sétimo dia.
Vamos então à prenda para os meus amigos. É um dos melhores textos que li, sobre um dos melhores anúncios publicitários que conheço e que se repete todos os anos pelo Natal.
As tradições não são apenas boas pela antiguidade do seu foral, mas pelas práticas que as caracterizam. O progresso humano tem sido e continuará a ser feito contra muitas tradições. Só pode manter-se como tradição o que engrandece a humanidade, não aquilo que a degrada ou embrutece.
É preciso dar um sentido à vida e a filosofia não deixa de ser isso mesmo: uma busca de sentido e, também, uma espécie de lubrificante no movimento da mecânica social.
Rasgar amizades por diferenças de opinião é negar a essência da democracia e um sintoma de menoridade mental. E também de intolerância.
O abandono dos idosos, a negligência e até os maus tratos a que tantas vezes são sujeitos, devem merecer a nossa melhor atenção e também o nosso mais veemente repúdio.
Não é apenas o contágio pelo vírus que pode acabar de vez com os mais velhos: há outros vírus não menos letais: o mergulho na depressão, a silicose do abandono, o roubo da alegria, a queda no poço sem fundo da solidão.
Assim trata padre Melícias os que desafiam o seu poder. Ora manda os inspectores plantar couves, ora aponta o dedo acusador a ministros e secretariozecos, como quem se movimenta nos quadros mentais de uma república de súbditos e não de cidadãos.
Quero cultivar o gosto de ter com quem conversar, mesmo que apenas através do éter. Porque todo o homem tem o dever de dar aos outros não o que lhe resta, mas o que ainda lhe faz falta.
A criminalização de quem ajuda a salvar vidas é um escarro lançado à nossa consciência. Não é só Veneza que se afunda. É também a Europa que cai a pique, ao perder cada vez mais as referências da sua ancestral tradição humanista.
Viagens
As águas oscilam entre um azul-turquesa e um verde-esmeralda. E depois, a luminosidade, a claridade azul difícil de descrever, os aromas adocicados suspensos no ar. Dir-se-ia que os deuses andaram por aqui, deixando a sua marca neste lugar único e desde sempre pressentido.
Há praças assim, que merecem ser amadas pelos amantes. Talvez não por acaso, Casanova, o sedutor, era veneziano.